Arquivo: Edição de 15-05-2003
Santarém foi palco da polémica entre duas facções monárquicas rivais
Quem é o legítimo herdeiro da Ordem de São Miguel de Ala, fundada pelo primeiro rei de Portugal após a conquista de Santarém aos mouros? O fadista Nuno da Câmara Pereira diz que é ele. Francisco Ramalho, um residente na cidade afirma exactamente o mesmo e chama “farsante” ao seu opositor. Certo, certo é que à custa das duas facções da velha Ordem, foram nomeados mais umas dezenas de cavaleiros. D. Duarte Pio está no meio da polémica.
Está instalada a polémica nas hostes monárquicas, por causa da Ordem de São Miguel de Ala. Dois grupos, um liderado pelo fadista Nuno da Câmara Pereira e outro por D. Duarte Pio, duque de Bragança, reclamam-se legítimos representantes daquela Ordem fundada por D. Afonso Henriques em Santarém após a conquista da cidade aos mouros.
A confusão atingiu o auge na semana passada com a realização em Santarém de duas cerimónias distintas de investidura de novos cavaleiros. Na quinta-feira, a facção liderada por Nuno da Câmara Pereira investiu novos membros da Ordem numa sessão realizada na Igreja da Graça. Dois dias depois, na Igreja do Milagre, nova cerimónia destinada aos mesmos fins, presidida por D. Duarte Pio, onde foram investidos 25 cavaleiros, entre eles o governador civil de Santarém, Mário Albuquerque.
“Nós vivemos num Estado de direito e a única Ordem de São Miguel de Ala que existe no país é esta, instituída por D. Afonso Henriques e restaurada em 1981, inclusive com D. Duarte a integrá-la. Isto é indubitável e indiscutível”, diz o fadista.
Do outro lado a resposta não se fez esperar: “O que aconteceu na quinta-feira foi uma farsa, uma imitação”, contrapõe Francisco Ramalho, um membro da Ordem residente em Santarém que considera D. Duarte como grão-mestre e legítimo líder dessa entidade seguidora dos ideais monárquicos.
Nuno da Câmara Pereira tem outros argumentos e garante que a Ordem de São Miguel, de que se arvora representante, está devidamente reconhecida pelo direito civil. Depois, tendo como alvo os seguidores do pretendente ao trono, afirma: “Essa Irmandade, agora fundada por D. Duarte, não tem legitimidade nenhuma, porque não está debaixo do direito canónico nem debaixo do direito civil”.
Afinal quem tem razão? Francisco Ramalho responde do outro lado da barricada dizendo que Nuno da Câmara Pereira “é um farsante” com alguma “capacidade para cativar pessoas”. “Não me admiro que ele faça isso, mas sim que haja pessoas que o sigam”, reforça, acrescentando que ele está a actuar “à revelia” da Ordem.
O fadista tem outra versão. Diz que D. Duarte é que se afastou da Ordem e que não tem legitimidade para se intrometer nas suas actividades. “D. Duarte será, quando muito, pretendente ao trono de Portugal. Não é rei de Portugal nem tem jurisdição sobre Portugal, tanto quanto sei”.
Nuno da Câmara Pereira vai mais longe: “Esse é um problema que não é meu! Eu estou no meu direito, sou um homem livre e de bons costumes. Como isto não é uma brincadeira e como estamos consignados a um capítulo geral e o D. Duarte é que se auto-excluiu de São Miguel da Ala, à qual pertenceu, é livre de se ir embora. Está cá quem vier por bem. Quem não se sentir bem, a porta é grande, larga…”, diz Nuno da Câmara Pereira.
Francisco Ramalho contesta referindo que Nuno da Câmara Pereira – que poderá ser alvo de um processo judicial por apropriação indevida de títulos e símbolos - não tem poderes para investir novos cavaleiros “porque não é monarca nem pretendente ao trono”. Daí referir que a única cerimónia autêntica foi a realizada no sábado, onde esteve presente D. Duarte.
Breve história da Ordem de São Miguel
A Real Irmandade da Ordem de São Miguel da Ala tem vários elementos oriundos da região. É uma associação de fiéis católicos herdeira das tradições e símbolos da antiga Ordem de Cavalaria Portuguesa dedicada a São Miguel e fundada, segundo a tradição, por D. Afonso Henriques depois da tomada de Santarém aos mouros em festa de São Miguel do Monte Gargano, em 8 de Maio de 1147.
A Ordem, segundo a lenda relatada por alguns historiadores, terá sido criada após a aparição de São Miguel na tomada de Santarém aos mouros. Um milagre que o primeiro rei de Portugal terá querido perpetuar criando essa Ordem, a mais antiga das ordens de origem portuguesa.
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